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A reforma trabalhista libera a “pejotização” nas empresas?

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Reforma cria a figura do autônomo exclusivo, que poderá prestar serviços de forma contínua e para uma única empresa sem que isso seja caracterizado como vínculo empregatício

O texto da reforma trabalhista aprovada nesta terça-feira (11/07) pelo Senado Federal prevê a criação de uma figura até então inexistente nas leis do trabalho, o chamado “autônomo exclusivo”. Agora, um profissional poderá prestar serviços de forma contínua e para uma única empresa sem que isso seja caracterizado como vínculo empregatício.  Críticos da reforma dizem que a regra, em outras palavras, facilita (ou até mesmo libera) a contratação de trabalhadores — pessoas jurídicas ou físicas — sem carteira assinada. A estratégia é conhecida como “pejotização”.

Apesar de muitas empresas contratarem PJs para trabalhar como um funcionário regular, isso não é permitido pela lei brasileira. Companhias costumam usar a estratégia para economizar nos custos trabalhistas. Porém, quem faz uso de tal manobra pode sofrer as consequências mais tarde, caso o profissional decida levá-lo à Justiça. Se comprovado o vínculo empregatício, a companhia fica obrigada a indenizar o trabalhador. Parte desse poder de reivindicação do profissional pode estar em risco, no entanto.

Na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o artigo 3° define os requisitos para um profissional ser considerado empregado de determinada companhia. Eles são: habitualidade (você tem de ir com determinada frequência à empresa), subordinação (obedece ordens e tem de justificar faltas) e salário (remuneração com continuidade, todos os meses). Embora não esteja elencada entre os requisitos, a “exclusividade” do profissional também era uma das evidências aceitas pela Justiça como comprovação do vínculo empregatício nas ações trabalhistas.

Agora, a exclusividade é permitida — e pode ser contínua. Ou seja, o contratado pode trabalhar todos os dias para aquela empresa. “A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado”, diz o texto da reforma aprovada.

De acordo com a advogada Caroline Marchi, sócia da área trabalhista do escritório Machado Meyer Advogados, boa parte dos artigos contidos na reforma trabalhista são respostas à Justiça do Trabalho. Com esse, não é diferente. “Os juízes entendiam que, se o profissional só trabalhava para aquela empresa, era empregado”, diz Caroline. “O que esse artigo vem dizer para a Justiça do Trabalho é que a exclusividade não é uma característica que leva necessariamente a considerar que esse trabalhador é empregado.” Isto é, ser exclusivo, por si só, não gera vínculo empregatício.

Antônio Silva Neto, assessor jurídico do deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma trabalhista na Câmara, negou que esse artigo facilite a pejotização. Segundo ele, profissionais ainda podem recorrer à Justiça, caso desempenhem o mesmo papel de um trabalhador celetista (contratado pela CLT). Mas, agora, outro critério deverá ser usado para provar o vínculo empregatício: a subordinação. “A subordinação é um elemento imprescindível da relação de emprego, como aparece no artigo 3º da CLT”, afirma Silva Neto. “Se você for averiguar tanto na doutrina trabalhista quanto na jurisprudência do próprio TST [Tribunal Superior do Trabalho], a subordinação é um dos elementos mais importantes.”

Ele diz que o exemplo “mais simples e claro” para entender como funcionará o autônomo exclusivo é a forma como poderia trabalhar um caminhoneiro. “Imagine que eu tenho um caminhão. Só que, para mim, é muito difícil conseguir viagens. Então, eu chego para uma transportadora, ofereço meus serviços e firmo um contrato com ela. Eu não serei empregado dela, não tenho subordinação. Posso fazer o que eu quiser — dirigir o número de horas que eu quiser, escolher onde vou parar. A empresa não vai me dar ordens.”

A ideia, segundo Silva Neto, é que o trabalhador atue com total independência — o que importa é a entrega dos resultados. No caso deste exemplo, que a carga seja entregue no local e no dia previsto.

Com a mudança na legislação, os juízes irão analisar nas ações trabalhistas o “gerenciamento” da empresa sobre o profissional para decidir se ele tem ou não vínculo empregatício. Isto é, a empresa controla o trabalho dele da mesma forma que faz com os outros funcionários? “Se o autônomo for tratado como empregado, vai ter vínculo empregatício — isso não mudou”, afirma Maria Lúcia Benhame, sócia-fundadora da Benhame Sociedade de Advogados. “O que a lei está dando é uma segurança jurídica maior para uma contratação verdadeira de um autônomo.”

Do outro lado, os críticos da reforma dizem que essa peculiaridade da subordinação deveria estar descrita no texto aprovado (não há menção a isso) e são taxativos ao defender que existe risco. “De acordo com o que está escrito na reforma, vai funcionar na base do vale-tudo”, diz o procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Fleury. “Esse artigo não facilita a pejotização. Ele libera a pejotização. Qualquer um pode ser pejotizado — tanto o diretor como o faxineiro da empresa.”

Na visão da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), o “autônomo exclusivo”, em si, já é uma contradição em termos. “Eu não contrato um autônomo que é exclusivo. Com a exclusividade, ele perde a autonomia”, afirma a juíza Noemia Porto, vice-presidente da Anamatra. “É bastante polêmico. Eu emprego alguém como autônomo exclusivo e consigo com isso retirar direitos básicos, como férias, 13º, FGTS, proteção contra demissão e assim por diante.”

FONTE: Revista época Negócios

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